domingo, janeiro 07, 2007



O FREVO CONVIDA O POVO
PRA FESTA DO CENTENÁRIO. (*)
José Honório - 07/01/07
__________________________________

Em Nove de “Frevereiro”
Eu farei aniversário
Pois novecentos e sete
Me jogou no calendário
Graças ao Jornal Pequeno
Hoje eu sou um centenário.


Mas sempre serei menino
Nunca irei perder o viço
Quem achar que vou morrer
Preste atenção no serviço
Pois nenhum pernambucano
Vai gostar do meu sumiço.


Cem anos não são cem dias
Por isso meu camarada
Mereço mesmo homenagem
Uma homenagem arretada
Do povo que me ajudou
Enfrentar essa parada.


Parada de resistir
Sobreviver apesar
De todo ataque impetrado
Contra o que é popular
O fervor do povo fez
Ao centenário eu chegar.


Conseguiram me trancar
Na jaula do carnaval
Do gueto de Pernambuco
Quase não saio, afinal
Mas saibam que mesmo assim
Eu sou um bem nacional.


Fico feliz ao saber
Que lembro sempre folia
Carnaval, festa, gandaia
Rebuliço de alegria
Porque sou contagiante
Quem me ouve se extasia.


Mas justiça seja feita
Eu não quero me gabar
Só que eu tenho qualidade
Isso ninguém vai negar
É pena o resto do ano
Ninguém querer me escutar.


Ninguém, não, para ser justo
Eu sei que tem muita gente
Que me escuta o tempo inteiro
Me defende veemente
Reconhece o meu valor
Me promove tenazmente.


Porém muitos me desdenham
Só me dão mesmo valor
Na hora que eu ataco
Sem perdão, seja quem for
Quando em Pernambuco assumo
Meu posto de Imperador.


Porém não sou opressor
Eu divido o meu reinado
Com coco, maracatus
Caboclinho, outro coitado
Que também é esquecido
Por muitos menosprezado.


No carnaval deito e rolo
Não deixo ninguém na sua
Eu provoco inquietude
Faço o povo ir pra rua
Não importando que esteja
Sob o sol ou sob a lua.


Varro as ruas do Recife
E de Olinda as ladeiras
Animando troças como
Elefante ou Pitombeiras
Também nos clubes e blocos
Entro de várias maneiras.


De rua, canção, de bloco
Formam em mim a trindade
Cada qual com seu encanto
Sua especificidade
Provocando em quem escuta
Vibração, prazer, saudade.


Quando eu chego e mando brasa
Onde quer que for eu faço
O povo que está presente
Se jogar logo no Passo
Que é a dança nascida
No rastro do meu compasso.


Folião confisca espaço
No meio da multidão
Com abre-alas, pernadas
Com tesoura e com rojão
Pra fazer os movimentos
Em constante inovação.


Quem sabe mostra o que sabe
Quem não sabe vem disposto
Aprende passo por passo
Se exibe com todo gosto
Se o suor pinga da testa
O prazer lhe cora o rosto.


Pernas e braços afoitos
Numa explosão de energia
Desafiam a gravidade
E também a anatomia
Mas também tem vez o dócil
Bailado da nostalgia.


Dos blocos com seu lirismo
Numa doce evocação
Aos valores do passado
Que presentes inda estão
Nas referências sonoras
Nos flabelos da ilusão.


“Comigo não tem perrepes”
Ou dá ou desce, é assim
Quer seja na Mauricéia
Ou seja lá na Marim
Quem achar ruim que corra
Para bem longe de mim.


Eu estou muito feliz
Não nego a minha emoção
Finalmente dão-me espaço
Merecida distinção
Por toda esta homenagem
Tenho muita gratidão.


Neste momento festivo
Eu preciso agradecer
Àqueles que deram a vida
Pra não me verem morrer
E as novas gerações
Pudessem me conhecer:


Zumba, Antônio Sapateiro
Carnera, Nelson Ferreira
Capiba, Mestre Levino
Zuzinha, Luiz Bandeira
Irmãos Valença e Morais
E Lourival Oliveira.


José Menezes, Ademir
Araújo, Maestro Spok
José Ursicino (O Duda)
Cada qual dando o seu toque
Para que eu sobrevivesse
E não ficasse a reboque.


João Santiago, Senô
Maestro Clóvis Pereira
Nunes, Edson Rodrigues
Formam time de primeira
Levaram-me ao pedestal
Da cultura brasileira.


Lembro também de Getúlio
Cavalcanti, a sumidade
Do frevo dolente como
Os do Bloco da Saudade
Bráulio de Castro e diversos
Valores desta cidade.


J. Michiles, Alceu
Carlos Fernando, Luiz
Guimarães, me renovando
Sem tirar-me da raiz
Espalhando meus acordes
Por norte e sul do país.


Gustavo Travassos, Nena
E Lula Queiroga, Valmir
Chagas, André Rio
Silvério Pessoa, Almir
Rouche e outros tantos
Que me fazem resistir.


Nonô Germano e seu pai
O grande Claudionor
A quem mais devo e sou grato
É o meu maior cantor
Não fosse ele, eu teria
Perdido logo o vigor.


Sivuca, Antônio Maria
Outros nomes não citados
Gênios de diversos gêneros
Por meus encantos tocados
Pra minha sobrevivência
Foram meus bons aliados.


Também devo à Rozemblit
De tão saudosa memória
Graças a ela eu vivi
O meu período de glória
Foi pelas águas levadas
Porém entrou pra História.


Dói ver o samba vendido
Como marca do país
Por que eu também não sou
Qual foi o mal que eu fiz?
O que ele tem que eu não tenho
Quem é aqui que me diz?


Modéstia à parte eu também
Tenho valor para ser
Escutado o tempo inteiro
Bastava a mídia querer
Abrir espaço pra mim
Façam isso, quero ver!


Porém não sou de queixumes
Porque meu sangue é binário
Ferve em mim a alegria
Pra qualquer um eu sou páreo
Vamos meu povo curtir
A festa do centenário.


Orquestra, rabeca, fole
Guitarra, flauta, teclado
Repente, coco, cordel
Cada um dê seu recado
Ficarei muito feliz
Por todos sendo lembrado.


“Quero ver carvão queimar
Quero ver queimar carvão”
Quero ver o povo todo
Celebrando com emoção
O Centenário do Frevo
Tesouro desta Nação.

*********


(*) -Este cordel foi publicado pela Prefeitura da Cidade
do Recife e lançado no dia do centenário do frevo (09-02-07)